ESTE PRODUTO É BOM PARA O CABELO?
Tal panaceia universal não
existe. Se nos disserem que tal produto é bom para a dor de barriga
desconfiamos, já que a forma de tratar dependerá da causa que provoca a dor.
Relativamente ao cabelo o mesmo acontece. Importa primeiro se há ou não doença
e, no caso de haver, obter um diagnóstico preciso para poder prescrever o
melhor tratamento. Assim, por exemplo, preparados de vitaminas e
oligo-elementos só melhorarão quem tenha carência dos mesmos. Minoxidil em
loção ou finasterida em comprimidos só melhorarão quem tenha alopécia
androgenética. Irritantes e corticoesteróides, quem tenha alopécia areata.
Antibióticos, quem tenha foliculite decalvante; e assim em diante. Portanto, o
produto bom para o cabelo não existe.
O CABELO CAI MESMO NO OUTONO?
Desde há algum tempo sabe-se que
cerca de 70% das pessoas têm queda sazonal, que provavelmente é homóloga à muda
de pelo de outros mamíferos e que é mediada pelas alterações endócrinas que a
exposição à luz provoca. O fenómeno chama-se deflúvio telógeno e corresponde a
um aumento do número de cabelos que estão na fase final do ciclo capilar.
Também pode ser provocado por outros estímulos como doença, cirurgia,
medicamento, pós-parto ou até por estarmos mais preocupados.
LAVAR MUITAS VEZES FAZ MAL AO
CABELO? E PRODUTOS? E FAZER TRANÇAS? E A SECAGEM?
Lavar mais vezes o cabelo não faz
cair mais cabelo. Trabalhos que comparam, na mesma pessoa, o número de cabelos
que caem lavando três vezes por dia e uma vez por semana concluem não haver
diferença no número de cabelos perdidos. Também o uso de gel ou amaciadores não
aumenta a queda de cabelo. Já as extensões e as tranças, se determinarem
tracção significativa, podem aumentar a queda. O uso de secadores normalmente
não é prejudicial, excepto se o cabelo não for previamente limpo com a toalha.
Secar com secador diretamente cabelo muito molhado pode danificá-lo.
ESTE PRODUTO É BOM? É NATURAL!
Sou confrontado todos os dias
pelos meus pacientes sobre o uso de produtos naturais para a pele e para o
cabelo. Mais de 90% das pessoas que me questionam sobre estes produtos têm as
seguintes convicções: 1. Como é natural não pode fazer mal. 2. Como é natural
vai fazer bem. O que significa algo ser natural?
Que provém da natureza ou a ela relativo; que não tem artifício, composição ou
mistura (ex.: iogurte natural); que existe na natureza; que não foi
criado pelo homem (ex.: lagoa natural). Transportemos para um creme ou
champô este conceito de natural – que existe na natureza e não criado (leia-se
intervencionado) pelo homem. Provavelmente quando comprássemos no supermercado
tal produto levaríamos para casa um boião de ranço, já que sem conservantes,
emulsionantes, antibacterianos e fungicidas, a grande maioria a maioria dos
cremes e champôs não se manteriam íntegros ao longo tempo. A maioria dos
produtos para a pele e cabelo ditos naturais não o são verdadeiramente – foram
alterados no sentido de poderem ser preservados no tempo ou de melhor se
adaptarem ao seu uso na pele. O segundo conceito é que o que é natural não pode
fazer mal. Esta tese não resiste a uma análise lógica: pensemos nos
envenenamentos por cogumelos, nas lesões da pele provocadas pelas urtigas, pela
lagarta do pinheiro, etc. Desde que existam componentes químicos (e qualquer
produto natural ou não os tem) existe um potencial de, em determinadas
circunstâncias, poder provocar problemas. Esse risco não é igual em todos os
produtos mas não é menor pelo facto de um determinado produto ser natural.
Finalmente, a origem “natural” não acrescenta probabilidade de eficácia. Nada
mais natural que cocó de vaca e não consta que seja bom a resolver problemas da
pele ou do cabelo. Na realidade, muitos dos medicamentos que usamos têm uma
origem na natureza (outros são sintetizados artificialmente). A intervenção
humana visa precisamente torná-los mais adequados à sua função – aumentar a
tolerabilidade, o efeito terapêutico, a cosmeticidade, etc.
NÃO
POSSO ACREDITAR QUANDO DIZEM ESTAR PROVADO?
O
paciente informado deve focar-se na existência ou não de trabalhos científicos
credíveis que suportem o uso de determinados medicamentos. Na minha área
preferida de atuação, as doenças do cabelo, posso dar vários exemplos de
incongruências:
1. Há
champôs no mercado que dizem tratar a alopécia androgenética (calvície comum)
quando não existe nenhum estudo sério que o demonstre.
2.
Alguns produtos (tanto de aplicação local como para tomar) vendidos para a
alopécia (menos cabelo) não têm estudos científicos que os suportem e baseiam
as suas campanhas em publicidade agressiva que envolve pessoas conhecidas do
grande público. A grande maioria dos produtos “anti-queda” têm na realidade
apenas efeito volumizante e deveriam publicitar-se como tal.
3.
Existem clínicos que dizem possuir tratamentos eficazes que mais ninguém detém
(como se tal fosse possível na era da informação) e aplicam substâncias no
couro cabeludo (habitualmente em microinjecções) cujo efeito de longo prazo na
alopécia não está provado. O mesmo acontece com dispositivos LASER anunciados
como milagrosos e cujo único efeito palpável de longo prazo para o paciente é
menos uns milhares de euros.
Como em outras áreas, a charlatanice combate-se com a
informação. Embora seja por vezes uma batalha desigual, é obrigação dos médico
e dos pacientes informados travá-la.
Dr.
Rui Oliveira Soares